A AÇÃO SOCIAL E O CRISTÃO
1 Seja constante o amor fraternal.
2 Não se esqueçam da hospitalidade;
foi praticando-a que, sem o saber alguns acolheram anjos.
3 Lembrem-se dos que estão na prisão,
como se aprisionados com eles; dos que estão sendo maltratados, como se fossem
vocês mesmos que o estivessem sofrendo no corpo.
4 O casamento deve ser honrado por
todos; o leito conjugal, conservado puro; pois Deus julgará os imorais e os
adúlteros.
5 Conservem-se livres do amor ao
dinheiro e contentem-se com o que vocês têm, porque Deus mesmo disse:
"Nunca o deixarei, nunca o abandonarei".
6 Podemos, pois, dizer com confiança:
"O Senhor é o meu ajudador, não temerei. O que me podem fazer os homens?
"
Carta aos hebreus
13:1-6
Ao
observarem-se genericamente os aspetos das ações sociais em nossos dias,
perceberemos com clareza que estas incidem basicamente em três áreas: a
solidariedade (incluindo a distribuição de recursos financeiros em programas
sociais governamentais), as minorias (que incluem indígenas, negros e as
questões de gênero) e a luta contra a violência (incluindo nela, a defesa da
mulher, da criança e dos excluídos).
Esses são os
tipos de manifestações sociais mais vistos nas campanhas do Governo, das ONG’s
especializadas e da militância em geral que trabalha nestes temas. Óbvio que
existem outras temáticas, mas não causam o mesmo impacto social, político e por
vezes marqueteiro de quem a batalha nessas frentes. Em todos esses movimentos
há realidades legítimas a serem tratadas e ações concretas a serem
implementadas, mesmo por força da Lei.
Embora essas
agendas sejam importantes, elas não são as únicas que deveriam permear a mente
dos cristãos. No texto escolhido aponto sete áreas de ação social que são
ordenadas nas Escrituras para delas nos ocupar. Isto significa que para o
genuíno cristão, as questões sociais são extremamente importantes, mas não são
ditadas pela agenda criada na Academia, na sociedade ou na mídia. Nossas ações
são ditadas pela agenda da Escritura com todas as suas particularidades.
Analisemos a
seguir a agenda social do cristão revelada nas Escrituras Sagradas e ao final,
iremos perceber que somos ordenados a ir além do óbvio, do midiático, do senso
comum e do “urgente” que se apresenta todos os dias. As ações sociais cristãs
são de longo prazo e voltadas não somente para auxiliar o indivíduo em
sofrimento, como para transformar sua maneira de viver, levando-o a um nível
que chamamos de verdadeira liberdade. Vamos a elas.
Amor Fraternal
Essa palavra
se refere ao amor que vai além de declarações vazias faladas mecanicamente com
o intuito de agradar ou tirar proveito de alguém. Esse amor não é somente um
sentimento interior “platônico” que nada faz ou realiza em relação ao outro.
Tampouco é o amor que erroneamente pode ser confundido com atração sexual entre
as pessoas. O amor fraternal é a ação concreta na direção do alvo deste amor
que pulsa dentro de uma pessoa em relação à outra. Amor fraternal nos leva a
agir sem buscar recompensas ou gratidão dos que foram beneficiados por ele. É
do amor fraternal a famosa frase: “quem ama cuida”, e isso vai além de um
desejo particular ou de carências emocionais egoístas.
Hospitalidade
É certo que a
maioria das pessoas não sabe que a hospitalidade seja uma questão social.
Pensam diferente sobre esse assunto. Alguns não se imaginam sendo hospitaleiros
num mundo perigoso como o de nossas grandes cidades nem a parentes, quanto mais
a desconhecidos. Mas aqueles que, como eu, tiveram que abrir suas casas a
pedidos de amigos de outras nações a pessoas que não conheciam e só vinham com
a recomendação do outro, sabem o que a hospitalidade significa. Abrigar pessoas
em trânsito, com os devidos cuidados e recomendações, em alguns casos pode se
tornar uma experiência libertadora. Existem pessoas maravilhosas no mundo que
nem imaginamos, elas parecem-se com “anjos”.
As Prisões
Para a
população em geral a prisão é um lugar para depositar criminosos, gente
perversa e os que rejeitaram a vida pacífica em sociedade. Não se importam com
o que acontece por trás daqueles muros altos, porque nenhum dos seus está ali.
Isso não é um convite a olhar um assassino cruel ou estuprador com “bons
olhos”, mas um convite a valorizar a vida humana, mesmo que o criminoso não a
tenha valorizado. Saber o estado dos presos e como será a sua reinserção na
sociedade de forma produtiva e pacífica é de extrema importância. Trabalhar por
melhores condições de se manter um prisioneiro em seus direitos básicos é ação
social. Acredito que se fizéssemos o exercício mental de nos colocar no lugar
de alguém preso, não importando o crime que cometeu, iriamos nos preocupar com o
que acontece com eles, pois, pelo fato de não termos prisões perpétuas, eles
voltarão às ruas e à nossa vizinhança. E depois?
A Violência
Os dados da
violência no Brasil e no mundo são assustadores, é só acessar a internet e
procurar pelos Mapas da Violência[1] dos últimos anos, eles
estão disponíveis a qualquer pessoa. Violência contra a criança, contra a
mulher, o idoso, contra gêneros, contra imigrantes, contra as minorias, contra
raças, gerada pelas drogas, pelo álcool e tantos outros causadores dela, são
noticiados diariamente nos telejornais, rádios e portais online. É impossível
hoje, assistir um programa de notícias, sem que a violência seja retratada em
algum nível. Se o número não sabido de pessoas de todas as idades que são maltratadas
a cada dia, somados aos conhecidos fossem levados à corte, é possível que os
tribunais não se ocupassem de mais nada por muitos e muitos anos, deixando de
julgar quaisquer outros casos. Somos ordenados a nos mover em direção aos
maltratados como se estivéssemos em seu lugar.
O Casamento
Outra coisa
que não é alvo das ações sociais comuns: o casamento. Ao contrário disso, o
casamento tem sido vituperado e desprezado cada vez mais, seja pelo número
crescente de divórcios[2], seja pela mudança nos paradigmas
que permitem que qualquer tipo de família seja constituída[3]. Não sou juiz ou
parlamentar e também não atuo na defesa do casamento pós-moderno, mas tenho
minhas opiniões formadas acerca desse assunto. Ainda hoje se sabe e se aprende
que a família é a célula básica da sociedade, ninguém discute isso, apenas que
as definições de família têm sido constantemente forçadas a mudanças de acordo com
os desejos dessa atual geração de pessoas que perderam seu alicerce na família
tradicional. Mudando o conceito de família, é claro que se altera o conceito de
casamento, pois um forma o outro. Muitos estudiosos têm analisados os dados da
violência, da violência familiar, das drogas e da criminalidade e, têm
erroneamente em parte atribuído essas coisas à falta de educação, mas isso é
uma conclusão parcial. É preciso ter a coragem de nadar contra a maré e contra
o que chamo de senso comum acadêmico e dizer que a mudança à qual a família
tradicional foi forçada nestes últimos tempos também é a causadora desses prejuízos
sociais que analisamos e verificamos hoje. Isso é fato.
O Sexo
A intensa
exposição sexual a qual a sociedade e as crianças estão submetidas no último
século chega a ser doentia. As taras e os desvios sexuais nunca estiveram tão
evidentes. Os crimes sexuais estão em vertiginosa ascensão[4]. Falar disso não é atentar
contra a psicologia ou contra a liberdade das pessoas, nem tampouco manter
tabus dos quais os cristãos e religiosos são continuamente acusados. O fato
deve ser visto e percebido pelo próprio fato, ou seja, os crimes sexuais têm
aumentado e os motivos não são apontados, por quê? Porque alguns sociólogos e
psicólogos não querem se expor quando tiverem que mencionar as possíveis causas
desses crimes, que vão além das doenças mentais. Existem doenças mentais
incluídas nesses crimes, é óbvio, mas em minoria[5]. O meu desejo não é
fomentar um puritanismo extremistas (que não aceita o prazer sexual como
criação divina), todavia, permitir uma libertinagem sexual hedonista[6] sem limites é igualmente
prejudicial. Muitos olham para Roma, Grécia e outras nações do passado e querem
resgatar os comportamentos sexuais delas, mas se esquecem que estas não existem
mais como no passado, e se não tivessem mudado, há muito teriam desaparecido.
Precisamos nos empenhar para ter uma posição clara em relação às questões
sexuais e defender essa posição, mesmo que pareça ultrapassado na mente de
alguns.
Avareza
São fatos
conhecidos por todos os que leem que o mundo capitalista (o Ocidente) passou
por basicamente três grandes períodos de recessão e quebra de suas bases de
sustentação que comumente foram chamados de “crises”: em 1929, nos anos 70 e em
2008[7]. Na busca dos motivos que
geraram essas crises foram encontrados muitos fatores como, a questão do
petróleo, as políticas internacionais estremecidas, importações e exportações
desniveladas, preço do dólar, supervalorização dos bens e imóveis e até a
extrema confiança nos sistemas capitalistas, mas raramente tocou-se no ponto
nevrálgico das crises: a ganância de homens que detinham e detém o poder sobre
o dinheiro e os negócios no mundo. Não se trata de uma história de teoria da
conspiração, mas a ganância, a avareza, o desejo pelo poder são os causadores
de grandes estragos na vida de famílias inteiras e de nações. A História tem
muito a nos dizer sobre isso desde que os impérios foram formados. O “amor”
doentio pelo dinheiro e por controle é a causa de guerras, genocídios e de
muitas atrocidades no mundo. A permissão governamental de aplicação de juros
desmedidos e abusivos por contratos de todos os tipos, bancários ou de outra
ordem, contra os seus cidadãos e a prática liberada de política de preços,
deixando esse controle apenas pela concorrência dos setores, é sancionar a ação
da avareza atingindo o fruto do trabalho das pessoas que ficam indefesas. É
preciso lutar contra toda a forma de opressão monetária ou de sistema
financeiro que amplie exponencialmente cada vez mais o abismo social entre pobres
e ricos. Lutar contra a avareza ou ganância é procurar uma justa distribuição
de renda e recursos entre todos os habitantes de um país. Sempre existirão
ricos e pobres, é fato, mas as distancias devem ser diminuídas a cada geração.
Conclusão
O autor da
carta aos hebreus encerra esta perícope declarando que não devemos temer os
homens porque o Senhor Deus estará nos ajudando nestas lutas. Creio que ele
afirma isso porque ao se empreender essas batalhas, o comum são as ameaças, o
perigo pessoal e familiar que alguns podem sofrer e as acusações ou processos
jurídicos injustos que podem recair sobre esses lutadores. Os verdadeiros
culpados poderão buscar expor intimidades, erros, pecados antigos desses
guerreiros da justiça e lançá-los ao vento da mídia na tentativa de desacreditá-los
e de paralisar as ações contra eles. Só para citar um exemplo, na revista
Época, uma reportagem sobre as irregularidades na Fundação Banco do Brasil,
levou a administradora de empresas Maria Suely Fernandes, que denunciou essas
irregularidades a sair de Brasília, morar em outro estado por causa de ameaças
contra si e seu filho e viver com medo a ponto de não dar entrevistas sobre o
assunto[8]. Esse muitas vezes é o
preço que um lutador social vai pagar por se insurgir contra o sistema
opressor, mas ele não está só, há outros, muitos outros que pensam iguais a ele
e ainda pode contar com a ajuda de Divina para lhe dar força e coragem para
continuar essas guerras.
© Carlos Carvalho
Teólogo, Cientista Social,
Escritor, Jornalista, Pr. Sênior da Comunidade Batista Bíblica e Fundador da
ONG ABAN Brasil.
[1]
Disponível em: http://www.mapadaviolencia.org.br/
[2] Divórcios no Brasil crescem mais de 40% em um ano, diz IBGE.
Disponível em: http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2012/12/divorcios-no-brasil-crescem-mais-de-40-em-um-ano-diz-ibge.html
[3] Novo modelo da família brasileira é discutido por especialista em Manaus. Disponível em: http://acritica.uol.com.br/manaus/Manaus-Amazonas-familia-brasileira-discutido-especialista-Manaus_0_982701759.html
[4] Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2013. PDF. Disponível em: http://www.nossasaopaulo.org.br/portal/arquivos/anuario2013.pdf
[5] Mente que mata. Disponível em: http://super.abril.com.br/ciencia/mente-mata-442855.shtml
[6]
Hedonismo. Teoria que declara que o
prazer é o valor mais elevado do homem. Dicionário de Ética. Editora Vida.
2005. p. 82.
[7] A crise estrutural do capital e sua fenomenologia histórica. Disponível em: http://blogdaboitempo.com.br/2012/09/21/a-crise-estrutural-do-capital-e-sua-fenomenologia-historica/
[8]
A fiscal que fiscalizava. Revista
Época. n. 798 de 9 de setembro de 2013. p. 46
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